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O Esférico

Página independente de apoio ao Sporting Clube de Portugal. Opinião * Sátira * Análise * Acima do Sporting Mais Sporting

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O Esférico

11
Jul20

Desencalhados // Sporting 1 Santa Clara 0

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A nobre arte de desencalhar um carro de terras lamacentas constitui uma das tarefas mais ingratas do mundo. Exige mãos firmes, paciência, uma destreza peculiar na arte da guinada e um sentido de timing apurado. O pânico é contraproducente. A aceleração febril agudiza o problema.

O Sporting — muito por sua conta e risco — permitiu-se atolar-se num lamaçal futebolístico em Moreira de Cónegos. Cabia-lhe ontem a sempre dura tarefa de desencalhar-se desse percalço sem cair nos esbaforidos desesperos que, muitas vezes, em Alvalade, transformam um problema pontual num aluimento geral. (Quantas vezes no melhor registo não cai a nódoa dum deslize, seguido de outro, e depois de outro, até que, quando damos por nós, já só nos resta acenar a bandeirinha branca da rendição?)

Não, contrariar essa tendência — sobretudo no SCP — não é para gente fraca. Razão pela qual não dou grande importância à exibição questionável — mais uma — da equipa, e toda a importância aos 3 pontos.

Sem dramatismos, e em correcto tom, Amorim voltou a ir ao baile com o mesmo saiote híbrido em 3-5-3, apostando no foco colectivo em torno dum sistema que tem gerado os seus resultados, em detrimento de movimentos bruscos que pudessem agravar qualquer inquietude interna. Não discordo da teoria. Mas o desenvolvimento deste regime continua a suscitar as suas questões em campo, nomeadamente na forma como coloca uma preponderância arriscada em Coates na primeira fase de construção, ao mesmo tempo que encurta as opções de saída da equipa, algo que João Henriques, treinador do Santa Clara, soube capitalizar desde o início.

Seja com um adversário em pressão alta (Santa Clara), ou um adversário em pressão baixa (Moreirense), o efeito prático deste esquema parece estar na diminuição da dinâmica colectiva, muitas vezes reduzida a verticalizações inconsequentes ou à horizontalidade estéril da posse à retaguarda. Ainda assim, o brilhantismo do primeiro toque de Wendel oferece muitas vezes um bálsamo precioso que activa sectores, do mesmo modo que as investidas de Ristosvki (um dos melhores) e Nuno Mendes dão aqui um complemento que une a lógica do 3-5-3 em redor dum propósito mais promissor.

Houve momentos de bom entendimento, sim, embora não com a regularidade adequada. Porém, se ofensivamente o sistema levanta dúvidas, defensivamente os números não mentem, com o Sporting a sofrer apenas 4 golos nos últimos 8 jogos. Por isso, o que o ataque (ainda) não esclarece, a defesa torna claro, e assim pavimenta a solidez que depois permite à juventude dianteira tentar as vezes que quiser, até desencalhar o resultado.

Não obstante, a regra geral tem sido a má definição no último passe ou no remate. Disto também tem padecido Sporar — como vítima e culpado. Convém relembrar que, pese embora o voluntarismo do esloveno, é na sua ineficácia que tem residido o seu maior pecado, com uma falta de acerto que estende até às poucas oportunidades que tem. Tudo isto é compensado pelas exibições consistentes de Ristovski, Wendel, Quaresma ou Coates, às quais se junta a habitual estrelinha de Jovane, a quem coube protagonizar o golpe de lince que o levou a adiantar-se à savana defensiva dos açorianos para abençoar a bola de efeitos práticos na busca de um sentido de vida. No fim, a vitória assenta-nos bem.

P.S.: daqui a uns dias, então, marcamos encontro no Porto. Um jogo difícil, mas onde antecipo uma atitude competitiva e enérgica do Sporting — pelo menos até onde a inexperiência lhe permitir. Conto divertir-me à grande, independentemente do resultado.

17
Dez19

De Luva Branca // Santa Clara 0 Sporting 4

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Sem inventar, sem recorrer a alquimias confabuladas no córtex delinquente do cérebro, o Sporting arrancou ontem a sua melhor exibição, até à data, no campeonato português. Podemos apenas imaginar o que deve ter custado a Silas decidir a equipa para este jogo. Silas — cujo voto de silêncio o reveste duma aura de monge trágico num cenário de apocalipse — não exibe aquele ar de angústia reprimida por acaso. É um homem torturado. À noite, depois de deitar os jogadores e passar a pente fino o hotel à cata de ultras atrás dos cortinados, recolhe aos seus aposentos, onde fica a sós com velhos fantasmas. De um lado tem um anjinho que lhe sopra ao ouvido líricas delicadas sobre consistência, identidade e lógica num colectivo desportivo. Do outro lado tem um diabrete que lhe sussurra fábulas pérfidas, garantindo-lhe que a melhor maneira de provar o seu valor é congeminar uma complexa equação quântica na qual Jesé, Eduardo e Rosier possam coexistir no corpo enxertado dum monstro futebolístico mais dado a feitiçarias de savana do que à prática de chutar a bola.

Porém, após uma agitada véspera que lhe comoveu a alma, Silas optou pelos conselhos do primeiro. E assim, quando ontem o Sporting subiu ao relvado do Estádio de São Miguel, apresentou-se à refrega com os 11 jogadores que, neste momento, aparentam dar mais garantias à equipa — no sistema que melhor rentabiliza as suas características.

Afoito em teoria, mas cândido na sua essência, o Santa Clara mostrou ser o adversário ideal para o Sporting nesta fase perigosa da época. Não é por acaso que não vence há 7 jogos, assim como não é por acaso que os tiros que lhe decretaram a morte cerebral tenham sido disparados a fechar a 1ª parte e a abrir a 2ª — espaço temporal do velório para equipas em desinvestimento psíquico.

Melhores em campo? Luiz Phellype, Bolasie e Ristovski — com menção honrosa para Vietto. É verdade que raros são os opinadores que mencionam o macedónio num contexto de lisonjeio. Mas é, na humildade dos 2,5 milhões que custou, tudo aquilo que Rosier não consegue ser do alto dos seus faraónicos 8 milhões. É menos destrambelhado do que o francês no critério com que define as jogadas, e mais sólido, quer a atacar, quer a defender. Ontem, a sua presença fez-se sentir sobretudo em finos pormenores, que taparam momentos de potencial desequilíbrio do colectivo. Nunca será um jogador de excelência, mas é o melhor lateral de raiz que temos no plantel — algo que deveria suscitar a preocupação de todos. Já Bolasie, por seu turno, resgatou do passado o golo que a justiça lhe devia, tal é o empenho e alegria que empresta ao jogo — uma alegria, claro está, um tanto rústica e despojada, como um churrasco de Domingo, mas ainda assim legitimadora do título de "empréstimo do ano". Ele corre, ele pula, ele atira-se, ele rebola — e confere a esta cacofonia de movimentos uma intuição técnica residual, diria que nascida do instinto de sobrevivência, não tanto do talento inato. Fez um belo golo de cabeça, de costas, numa rotação perpétua em gravidade zero, numa ode à complexidade que, basicamente, prova porque jamais poderia ser um avançado. Esse papel está destinado a Luiz Phellype, um rapaz de modos melancólicos que chega a dar a impressão de empurrar as bolas para a baliza por despeito, tal é a solidão que o consome lá na frente. Mas empurra-as — e já o fez por oito vezes esta época.

Demoraram 24 horas a chegar, mas foram quatro murraças de luva branca bem espetadas no focinho encapuzado do veneno que corrói o clube.

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