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O Esférico

Página independente de apoio ao Sporting Clube de Portugal. Opinião * Sátira * Análise * Acima do Sporting Mais Sporting

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O Esférico

12
Set20

Comissão de Desonra

O Esférico

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Às vezes tenho que ler certas coisas duas vezes, porque o grau de surrealismo não cabe todo numa primeira leitura.
 
Até à data, Luís Filipe Vieira, e a SAD que dirige, são arguidos no caso "Saco Azul", que envolve branqueamento de capitais e fraude fiscal. A investigação dos e-mails continua a decorrer. Assim como a investigação relativa aos Vouchers. Luís Filipe Vieira é arguido — e prepara-se para ser acusado — na Operação Lex, onde há fortes indícios de que terá tentado comprar um juiz. Repito: comprar um juiz! Há ainda o caso e-toupeira, do qual Vieira e a SAD encarnada saíram "inexplicavelmente" ilesos, mas cuja acusação atingiu o seu braço direito, Paulo Gonçalves, que hoje enche a conta bancária em todo o tipo de negócios com o Benfica. Prosseguem também as investigações no âmbito dos jogos viciados em 2015/2016, assim como do Mala Ciao. A somar a isto, Vieira é ainda arguido por suspeitas de ter burlado o BPN, e vê-se agora implicado no Lava Jato brasileiro, num caso de corrupção que envolve a Odebrecht e a Doyen.
 
Sabemos que o antigo ladrão de camiões é "recomendável" quando elencamos uma lista dos seus crimes — consumados ou alegados — e não temos a certeza se nos escapou alguma coisa.
 
Tudo isto é público.
 
Como pode, então, um primeiro-ministro dum país integrar a Comissão de Honra para a recandidatura de tal personagem? Como é que isto é possível!? Como pode António Costa, cuja solenidade do cargo que ocupa deveria recomendá-lo a um distanciamento higiénico de tudo o que fede a trampa, emprestar o seu nome a este exercício de branqueamento reputacional? Já poucas coisas me chocam, mas isto é chocante. E preocupante.
 
Quando finalmente arrastarem Luís Filipe Vieira em algemas, um dia destes, virá António Costa dizer que não se tinha apercebido de nada de anormal, não estava ao corrente de nada? Não me surpreenderia. Afinal, falamos da mesma pessoa que andou com Sócrates pela mão, governou com Sócrates, rebolou no feno com Sócrates, mas nunca topou o distinto cheirinho a podridão de Sócrates. Neste concubinato de "ministros" já se torna difícil perceber quem é, afinal, o "primeiro".
 
Uma Comissão de Honra que é uma desonra capital para quem a integra, mas sobretudo para quem ocupa altos cargos governativos e autarcas. É o triunfo da cultura do "quero, posso e ninguém tem nada a ver com isso".
06
Jun20

O Seráfico Benfiquista

O Esférico

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Deve ser uma felicidade ser do Benfica — uma das raras bênçãos desta vida. Imagino eu, que vivo do lado de cá do inferno uma existência abjecta, poluta, imoral e servil. Por acaso sou do Sporting, mas, para tamanha indigência espiritual, tanto faria que fosse do Porto, do Tondela ou do Farense — era igual.

Nós, vencidos do clubismo, olhamos de olhos esbugalhados e carentes para esse oásis de virtudes nos antípodas de Lisboa, muito como um sem-abrigo espreita o caviar dos ricos pela vitrine panorâmica do Ritz.

Invejamos esses píncaros de grandeza, cobiçamos essas iguarias de altivez. Enquanto reviramos os escombros da nossa miséria, imaginamos, ansiosos, como seriam as nossas vidinhas se vivêssemos todos nessa 'penthouse' de probidade em que os ditosos lampiões habitam. Como seriam se habitássemos esse mundo mágico, onde os adeptos se multiplicam mais rápido do que a taxa de natalidade mundial, os fetos nascem com superagentes, as investigações evaporam-se nos misteriosos bosques da justiça, os jornais ungem-nos diariamente dos mais doces encómios e os nossos beiços se banham perpetuamente em inesgotáveis fontes de óleo-de-courato...

Uma das grandes vantagens do Benfica, por exemplo, é não ter claques. Nunca tiveram. Dúvidas? Quem o diz, categoricamente, é Luís Filipe Vieira, o líder encarnado. "Claques? Nunca soube que o Benfica tinha claques". O que é extremamente vantajoso, convenhamos. Enquanto outros lidam com catástrofes animais como a de Alcochete, os benfiquistas podem, por exemplo, canalizar todos os seus esforços para a produção em massa de vouchers beneficentes (outra regalia do associativismo encarnado) ou passes VIP para as classes desfavorecidas de directores da PJ e juízes da Relação.

Quem, na absurda tentação de argumentar pela paz desportiva, não foi já interrompido por um benfiquista que, emergindo elasticamente de trás do seu impenetrável muro ético, nos esmaga com este xeque-mate heróico: "ao menos nós não temos Alcochetes!"? Como é bom ser do Benfica! Despreocupadamente, levianamente, altaneiramente do Benfica!

Mas, por detrás de todo o ecossistema celeste, espreitam perigos — como um corpo seráfico sem defesas bacterianas.

Tremo então só de imaginar o que seria se um grupo de malfeitores atacasse o autocarro da equipa com tijolos de betão densos como o Isaías. Isso seria tremendamente embaraçoso, quando o nobre líder já confirmou a inexistência de tais pessoas. Com alívio, portanto, os benfiquistas não têm que temer que os seus ídolos sejam hospitalizados com vidros nos olhos, ou que os líderes da equipa vejam as suas casas vandalizadas com ameaças em plena luta pelo título... Ainda assim, admito que não seria nada recomendável que a UEFA fechasse o Estádio da Luz pelo comportamento de claques ilegais a quem se desse apoio logístico em todos os jogos... E seria um tudo nada intrigante — confesso — que um clube visse o seu estádio interditado pela FPF depois de anos a encobrir grupos que — graças a Deus — não existem! Tal como não faria sentido mostrar surpresa quando uma claque que nós próprios declarámos extinta andasse por aí a atropelar, esfaquear, pontapear e emboscar adeptos de outros clubes, em virtude da cobertura clandestina que lhe prestámos ao longo dos tempos... Certo, seria chato, um tudo nada incómodo, admito, e um pesadelo de relações públicas internacional...

Sim, tudo isso seria uma pena, uma terrível e fatal ironia. E — quase me atrevo a dizer — motivo para demissão colectiva e humilhação generalizada.

Felizmente, não há quaisquer indícios de que tal esteja para acontecer. O Benfica não tem hoje, nem nunca teve, claques. O que aconteceu nunca aconteceu. E, assim, o seráfico adepto benfiquista pode prosseguir a vida, confortavelmente embalado nos braços da grã-ventura.

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