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O Esférico

Página independente de apoio ao Sporting Clube de Portugal. Opinião * Sátira * Análise * Acima do Sporting Mais Sporting

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O Esférico

26
Jul20

Nasceu Torto // Benfica 2 Sporting 1

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O Benfica ainda deu 5 minutos de avanço, cedendo à nação leonina uns raros vislumbres de tele-entusiasmo com um par de arrancadas na direcção da baliza de Vlachodimos. Mas não foi preciso esperar muito até que a máscara caísse ao Sporting, revelando os seus verdadeiros objectivos para o derby.

Para o Sporting, aquilo parecia um treino específico cujos objectivos se resumiam a passar para o sítio errado, correr para buracos insofismáveis e atirar os braços ao ar em esbaforida consternação, numa tentativa de estudar os diferentes vectores do falhanço. Face à pressão alta do Benfica, e com poucas linhas de passe, os centrais leoninos responderam à abstrusa responsabilidade de saírem com bola com incompetente diligência, missão que cumpriram religiosamente durante cerca de 35', durante os quais entregaram a bola ao adversário — sem exagero — mais de 10 vezes junto à grande área (e às vezes dentro dela). E, enquanto os pupilos de Amorim cumpriam rigorosamente a inovadora metodologia, as ocasiões sucediam-se para os encarnados, até que o golo de Seferovic surgiu, não como uma punhalada súbita, mas como o fim lógico de um longo obscurecimento de faculdades.

Perante isto, qualquer treinador, confrontado com esta falta de soluções, teria ordenado aos seus defesas que, no mínimo, despejassem a bola na frente, em vez de a entregarem nataliciamente aos rivais. Mas não Amorim — e é por isso que gosto dele. A coerência é uma qualidade que prezo muito. Se a perdem cinco vezes, também a podem perder vinte. Não tem preço a fidelidade a um certo estilo de jogo.

Na 2ª parte, contudo, os pressupostos do jogo mudaram ligeiramente. As perdas de bola infantis continuaram a ser compulsórias, mas a entrada de Tiago Tomás, um Wendel mais cooperante com a saída de jogo, e um futebol mais directo a partir da retaguarda, permitiram que o Sporting rechaçasse o Benfica para terrenos mais inférteis e impusesse ao jogo as presenças até aí anódinas de Jovane e Sporar — tendo este último marcado no único toque decente que teve em toda a partida, após cirúrgica assistência de Tomás. Foi durante esses 25/30 minutos que o Sporting mostrou o seu melhor futebol, permitindo arrancar ao marasmo inicial exibições reconfortantes de Matheus, Nuno Mendes e Wendel, assim como o contributo precioso de Ristovski (eficaz a fechar, pressionante a subir) e Luís Neto (um oásis de experiência que evitou um descalabro prematuro).

Infelizmente, talvez sem o saberem, já estavam em marcha os acontecimentos que atirariam o Sporting para o 4º lugar, mercê da exibição pírrica frente ao Setúbal, à qual a reviravolta bracarense frente ao Porto e as graduais cedências da imaturidade leonina à eficácia benfiquista perto do fim apenas vieram amargar o travo de fatalismo que nos persegue, e que parece sempre óbvio à distância.

Acabou derreado o que nasceu torto. Ainda assim, este jogo não deixa de ser uma lição de matemática valiosa. Se "o mesmo" só chega para 30 minutos de futebol competitivo, "mais do mesmo" para 30 minutos chegará. Há quem saiba fazer contas destas na SAD?

P.S.: eu não páro de avisar: escorregadelas antes do Benfica dá derrota com o Benfica. Entre aquela gente toda, não creio que haja uma grama de noção histórica.

11
Jul20

Desencalhados // Sporting 1 Santa Clara 0

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A nobre arte de desencalhar um carro de terras lamacentas constitui uma das tarefas mais ingratas do mundo. Exige mãos firmes, paciência, uma destreza peculiar na arte da guinada e um sentido de timing apurado. O pânico é contraproducente. A aceleração febril agudiza o problema.

O Sporting — muito por sua conta e risco — permitiu-se atolar-se num lamaçal futebolístico em Moreira de Cónegos. Cabia-lhe ontem a sempre dura tarefa de desencalhar-se desse percalço sem cair nos esbaforidos desesperos que, muitas vezes, em Alvalade, transformam um problema pontual num aluimento geral. (Quantas vezes no melhor registo não cai a nódoa dum deslize, seguido de outro, e depois de outro, até que, quando damos por nós, já só nos resta acenar a bandeirinha branca da rendição?)

Não, contrariar essa tendência — sobretudo no SCP — não é para gente fraca. Razão pela qual não dou grande importância à exibição questionável — mais uma — da equipa, e toda a importância aos 3 pontos.

Sem dramatismos, e em correcto tom, Amorim voltou a ir ao baile com o mesmo saiote híbrido em 3-5-3, apostando no foco colectivo em torno dum sistema que tem gerado os seus resultados, em detrimento de movimentos bruscos que pudessem agravar qualquer inquietude interna. Não discordo da teoria. Mas o desenvolvimento deste regime continua a suscitar as suas questões em campo, nomeadamente na forma como coloca uma preponderância arriscada em Coates na primeira fase de construção, ao mesmo tempo que encurta as opções de saída da equipa, algo que João Henriques, treinador do Santa Clara, soube capitalizar desde o início.

Seja com um adversário em pressão alta (Santa Clara), ou um adversário em pressão baixa (Moreirense), o efeito prático deste esquema parece estar na diminuição da dinâmica colectiva, muitas vezes reduzida a verticalizações inconsequentes ou à horizontalidade estéril da posse à retaguarda. Ainda assim, o brilhantismo do primeiro toque de Wendel oferece muitas vezes um bálsamo precioso que activa sectores, do mesmo modo que as investidas de Ristosvki (um dos melhores) e Nuno Mendes dão aqui um complemento que une a lógica do 3-5-3 em redor dum propósito mais promissor.

Houve momentos de bom entendimento, sim, embora não com a regularidade adequada. Porém, se ofensivamente o sistema levanta dúvidas, defensivamente os números não mentem, com o Sporting a sofrer apenas 4 golos nos últimos 8 jogos. Por isso, o que o ataque (ainda) não esclarece, a defesa torna claro, e assim pavimenta a solidez que depois permite à juventude dianteira tentar as vezes que quiser, até desencalhar o resultado.

Não obstante, a regra geral tem sido a má definição no último passe ou no remate. Disto também tem padecido Sporar — como vítima e culpado. Convém relembrar que, pese embora o voluntarismo do esloveno, é na sua ineficácia que tem residido o seu maior pecado, com uma falta de acerto que estende até às poucas oportunidades que tem. Tudo isto é compensado pelas exibições consistentes de Ristovski, Wendel, Quaresma ou Coates, às quais se junta a habitual estrelinha de Jovane, a quem coube protagonizar o golpe de lince que o levou a adiantar-se à savana defensiva dos açorianos para abençoar a bola de efeitos práticos na busca de um sentido de vida. No fim, a vitória assenta-nos bem.

P.S.: daqui a uns dias, então, marcamos encontro no Porto. Um jogo difícil, mas onde antecipo uma atitude competitiva e enérgica do Sporting — pelo menos até onde a inexperiência lhe permitir. Conto divertir-me à grande, independentemente do resultado.

07
Jul20

Fake Football // Moreirense 0 Sporting 0

O Esférico

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Ali por volta do minuto 50-e-troca-o-passo, Ricardo Soares, técnico do Moreirense, é subitamente acometido por uma onda de espasmos dilacerantes, reminiscentes da era dourada da revista à portuguesa. Acto contínuo, Pasinato, a 2ª peça neste dominó de dói-dóis, cai por terra, atingido por aquilo que, à primeira vista, poderia ser um caso tórrido de lombrigas ou cólicas oculares contraídas no decurso da observação do seu treinador. Por ali rebolou, impúbere, sonoro e lacrimejante, até que o árbitro dele se apiedou e ordenou a entrada das enfermeiras de serviço. Note-se que este tipo de comportamento é, por cá, analisado com a mesma bonomia com que se aceita que grupos de pelintras se empoleirem nas grades a cuspir para cima de jogadores e árbitros. "Faz parte", "é feio, mas inteligente", "são coisas do futebol", são apenas alguns epítetos com que, em Portugal, se celebra a arte do engano.

O Sporting, porém, também tem a sua própria versão do ofício. Não vem com a mesma plebeia boçalidade de outros, mas sim pela pluma estilística de escribas engravatados, conforme aos pergaminhos aristocráticos do clube. Se Pasinato rebola pela relva, o Sporting rebola por comunicados e contra-comunicados sobre o que o árbitro fez ou deixou de fazer. Chama-se a isto "quem não chora não mama". O Porto fá-lo. O Benfica fá-lo. O Braga fá-lo. E o Sporting também quer mamar — embora não goste de admiti-lo.

Porém, a realidade, para quem tiver estômago para tal, é mais agreste do que esta versão ficcionada dos eventos. O Sporting não ganhou o jogo porque não mereceu ganhá-lo. Nunca foi uma equipa lúcida, lesta ou dominante. A competência — quando a houve — reverteu para rodinhas de complacência onde a bola bocejava de jogador para jogador, empapada, triste e roliça — desconsiderada pelo abjecto espectáculo de ninguém saber onde ficava a baliza adversária.

O preço da juventude paga-se quando a finalidade do jogo é confundida com infinitos processos intermédios. E o maior truque que o Moreirense fez foi entregar a bola a um conjunto que não sabe reconhecer o seu potencial destruidor. Sem uma referência na área, torna-se ainda mais difícil focar aquelas cabeças jovens, agora que Sporar passou a personificar em campo a angústia paralisante das pinturas de Munch. E se na 1ª parte o problema foi a ligação entre a defesa e o ataque, na 2ª foi a desconsideração por jogadores como Jovane ou Plata, por cujos pés passaram os poucos momentos de repentismo de que a equipa dispôs, antes de finalmente se render, nos minutos finais, a uma salva de equívocos e passes estrábicos.

Tudo isto faz parte do processo de crescimento. Não estou deprimido, nem tenho que estar. Aliás, estou até confiante. Para o futuro. Amorim chegou e apontou logo uma mão-cheia de soluções que outros nunca ousaram descortinar. Os resultados melhoraram. As exibições também. Mas isso não altera o facto de que lhe atiraram para o colo um ramo de cartas imberbes — quando não inócuas —, para quem o menor grão de maturidade pode representar um embaraço sem igual.

Assim, hoje, a nação leonina entretém-se a mediocrizar-se com lances de arbitragem. Rebola-se nas fofas pastagens da desculpabilização. Talvez isso doa menos do que confrontar a evidência de que tivemos uma vantagem numérica que durou 45' e nunca soubemos o que fazer com ela.

02
Jul20

Acendam As Velas // Sporting 2 Gil Vicente 1

O Esférico

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Começam a avolumar-se os indícios de que, à septuagésima tentativa, Frederico Varandas terá finalmente acertado no treinador. Evidentemente, desembolsou um valor obsceno por ele. Mas quanto cada um de nós pagaria por um gato falante que aterra sempre em pé? Pois, nesta altura, Amorim parece ter imposto uma linguagem felina no seio do plantel que toda a gente entende.

Ultrapassada parece estar a rigidez mórbida dos tempos de Silas, ou a anárquica bonomia celebrizada por Keizer. Há uma nova elasticidade em voga e a sensação de que a equipa encarna várias dimensões para o mesmo fim. Olho para este Sporting e mal o reconheço. Olho para ele com a mesma admiração com que olhava para o veterano da turma, repetente de sábias andanças que parecia sempre recorrer ao melhor calão, aos melhores trejeitos, a afinidades inalcançáveis (todo o gesto que intentava parecia condenado ao insucesso e, no entanto, quando surgia do outro lado da mandriagem, dez piruetas depois, aterrava perfeito, enlaçado num sorriso confiante). De que outro modo podemos explicar esta recorrência de sucessos com a presença em campo, ora indiferente, ora desastrosa, de alguém como Borja? Quatro cambalhotas depois, aterramos em pé...

Agora, se somente Frederico Varandas acertasse em três ou quatro contratações de enfiada, este Sporting estaria pronto para liderar uma corrida pelo título já na próxima época. Pois, ironicamente, a vinda de Amorim não é só alívio para Varandas, é também a repudiação de Varandas. Repudiação, mais concretamente, pela forma anedótica como gizou a equipa para 19/20. Senão vejamos: o clube contratou nove jogadores para esta temporada. Porém, desses nove, apenas dois entraram no onze titular de ontem. Há uns dias, frente ao Belenenses, nem isso: apenas Sporar.

Amorim, claramente, não tem uma ideia muito positiva sobre os esforços da SAD anteriores à sua chegada. Ontem estrearam-se mais dois miúdos: Tiago Tomás e Joelson. Com similar descaramento, Amorim parece propor soluções, jogo após jogo, que todos os outros antes dele garantiam não existirem. E duas vidas opostas parecem coabitar em Alvalade neste momento: uma nova, que veio para ficar, e uma antiga, que será descartada. É este o espelho impiedoso que Amorim trouxe consigo, e montou no centro do relvado, apontado para as cúpulas dirigentes do 2º anel. Maior descaramento do que este só se a Belle Dominique aparecesse a dançar ao som de Jimmy Somerville numa marcha da extrema-direita.

P.S.: ao passo que jogadores como Plata, Jovane e Quaresma têm aproveitado cada momento para fincarem a sua bandeira em terras do futuro, outros, como Sporar ou Camacho, não têm conseguido acompanhar esta ascensão colectiva. Ultimamente, o esloveno parece desligado da equipa, alheio aos processos, desavindo com os timings de passe e remate. Mas, neste caso, poderemos estar a falar de uma provisória consequência das mutações tácticas de uma equipa à procura de si... Já no caso de Camacho, comparo o seu rendimento a alguém que tenta enfiar o mundo inteiro no buraco de uma agulha. Precipitado, forçado, atabalhoado — seja a jogar mais à frente ou mais atrás, tardo em perceber o motivo da sua aquisição.

19
Jun20

Sem Remorsos // Sporting 2 Tondela 0

O Esférico

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Rúben Amorim não está na disposição de pedir desculpas a ninguém. 13 milhões pela sua contratação? Foi porque quiseram. Reabilitar o 3-4-3 das cinzas da história? É o que tiver de ser. Entrar com oito miúdos em campo? Se o desafiarem, ainda mete mas é o Coro Juvenil de São Pedro do Mar a jogar também (não o desafiem).

Com tantas veleidades de ordem radical, era inevitável que os jogadores também lhe começassem a emular o pirete, uma revienga aqui, uma ultrapassagem em traço contínuo ali, uma fuga pelas traseiras além, uma ida sem máscara à área contrária acolá... Vemos este descaramento desportivo — cujo sustento real é uma salutar disciplina táctica —, por exemplo, na incursão nocturna de Plata por território hostil (da qual resultou o 1º golo), na cuequinha que Quaresma inflige ao avançado afoito, ou, súmula da inspiração, no último lance de génio de Jovane na partida, quando, simulando no grande círculo um vago interesse pelo sonambulismo, arranca, subitamente, afogueado por aguda traquinice, executando uma sinfonia vertical que só foi calada com um tiro nos pés. (Este, meus caros, é o tipo de raciocínio artístico que só talentos inatos como De Bruyne ou Bruno Fernandes executam.)

E ninguém tem sido maior depositário da mentalidade Amorim do que o próprio Jovane, um rapaz que a dada altura chegou a ser dado como morto, autopsiado, embalado e etiquetado — resgatado à última da hora, antes de enfeitar as prateleiras do mercado do futebol, por um treinador que sabe que o talento puro, conjugado com intrínseca humildade, deve ser nutrido, não descartado.

Esta perspectiva tem particular interesse numa altura em que o reatar do campeonato tem sido marcado pela timorata rigidez dos rivais, quiçá acorrentados às responsabilidades inatas da maturidade. No Sporting, a despreocupação gerou toda uma nova fé nesta pré-época improvisada. Joga-se hoje, mas a bola rola para o amanhã. E, ungidos com o voto de confiança de que precisavam, a miudagem traz à Liga a audácia que tem escasseado neste primado do medo.

A verdade é só uma. Se o campeonato tivesse começado em Junho, o Sporting estaria à frente de Porto, Benfica e Braga. Porque há entusiasmo pelo novo treinador, porque há espaços a conquistar, porque o percurso que findou em Março parece uma memória distante, e porque de quarentena continuam as tensões internas do universo leonino, mantidas à distância pela cerca sanitária da pandemia.

Mas não começou. No mundo real das paixões de bancada, da competição extrema e do empresariado selvagem, é possível que este 'status quo' caísse por terra. O tempo está suspenso para Amorim poder aferir quem é Jovane e quem é Djaló, quem é Nani e quem é Paim, e assim ordenar as peças do xadrez em conformidade com o que será a austeridade dos próximos tempos. Temos, pelo menos, essa modesta vantagem. Enquanto Benfica e Porto disparam os últimos fulminantes de uma era pomposa, o Sporting já entrou nessa nova era futura — a era da formação. E tenho cá para mim que será este novo leão que decidirá o último dos velhos campeonatos, indo roubar pontos à Luz ou ao Dragão.

Melhor augúrio dos novos tempos não poderia haver.

17
Jun20

O "Comandante" Weigl

O Esférico

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É nítido que os jornais desportivos hoje mais não são que "moços de recados" dos gabinetes de comunicação dos grandes clubes. Em suma, um desperdício de tempo e dinheiro.

Sem qualquer pudor que lhe acuda, o jornal "A Bola" assume-se orgulhosamente como o fiel escudeiro desse viveiro de suspeitas a que ainda hoje chamamos, piedosamente, Benfica.

Weigl foi propalado como o grande sucesso de bilheteira de Janeiro. Para não destoar, o Benfica desembolsou uns exorbitantes 20M pelo petiz.

Não posso deixar de notar, contudo, que desde a chegada do alemão os resultados do Benfica têm caído a pique. Se, numa primeira fase, o Benfica acumulara 20 vitórias, 4 empates e 4 derrotas, após a entrada do ex-Dortmund os registos estancaram numas agonizantes 7 vitórias, 6 empates e 3 derrotas. Pré-Weigl: 2.28 pontos por jogo. Pós-Weigl: 1.68 pontos por jogo.

Algo não correu bem nos cálculos. E, a julgar pelos resultados, o contabilista da obra foi o mesmo que arquitectou o saudoso RDT.

A opinião dum Sportinguista confesso é uma coisa. Mas acontece que este pormenor não escapou ao, por estes dias, olhar cortante dos adeptos encarnados, que não se furtaram a mencionar esse facto, não obstante as odes marítimas trauteadas à ceia pelo despreocupado Lage.

Por isso mesmo, com a devida diligência, os amigos de "A Bola" dedicam hoje a sua primeira página à nobre arte de polir nabos. É preciso relembrar que, melhor do que ganhar jogos, o que importa é que o sr. 20 milhões pegou no "comando" do navio — mesmo que o navio seja uma chalupa em naufrágio acelerado.

13
Jun20

Um Jovane No Deserto // Sporting 1 P. Ferreira 0

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É possível que Amorim saiba algo sobre o futuro de Mathieu que nós não sabemos. Ou que o véu do balneário oculte delitos que os olhos não vêem. Encostar o melhor defesa do Sporting para vincar a sua autoridade seria sempre uma opção controversa. Mas, na sua própria lógica retorcida, traz um grãozinho de sanidade ao planeamento da próxima época.

Mathieu é um dos melhores centrais que já passou pelo clube. É, para mim, o melhor a actuar hoje no país. Um elemento vital na equipa. Estes são factos que não nos oferecem contestação. Mas não formam a imagem completa do activo. Pois é precisamente a sua importância que o torna um elemento desestabilizador. Desde que chegou ao clube, o francês perdeu 29 jogos por lesão, equivalentes a 5 meses de paragem. Perdeu mais, na realidade, porque a sua condição obriga a que seja poupado frequentemente. No total, Mathieu tem uma taxa de ausência na ordem dos 25% no campeonato — um quarto dos jogos. Comparativamente, Coates não totaliza sequer 3 meses de paragem em 4 temporadas de leão ao peito. A defesa é montada em redor de Mathieu, naturalmente. Mas, devido a esta irregularidade, não consegue jamais atingir a estabilidade ideal. Caminha sobre brasas, entre o medo de não contar com o seu líder e a euforia de contar com ele. Muitos dos nossos problemas defensivos explicam-se nestes termos, por paradoxal que seja.

Amorim até pode ter comprado uma guerra inútil (não sabemos). Mas, ao fazê-lo, está também a apontar o caminho para o futuro. O Sporting tem que começar a olhar além de Mathieu.

Vietto é outro jogador na mesma linha. Um craque puro, visionário, elegante. Mas falta-lhe intensidade, fôlego, dimensão física, consequência. Quando está em campo — como ontem — traz ideias a um conjunto vegetativo. Quando se ausenta — como muitas vezes sucede — o rendimento da equipa cai na lama.

Enquanto o Sporting tiver estes como as suas referências, e as suas referências forem mera matéria fátua, o clube jamais poderá orquestrar um ataque credível ao título.

E é preciso falar sobre estas questões do futuro, porque nos é impossível falar sobre o jogo de ontem com conversa de gente, tão pobre foi. Pese todo o colorido táctico que se tentou emprestar à equipa, a verdade é que um jogo que servia para nos aliviar as dores da pandemia, acabou por relembrar-nos, de forma brutal, que este continua a ser o mesmo Sporting que está a 17 pontos do líder, que disputou meia época com um ponta-de-lança no plantel, que levou 4-1 do Basaksehir, que foi eliminado pelo Alverca, que contratou Jesé, que vai no seu 4º treinador esta época e que continua a socorrer-se de tipos como Borja ou Eduardo.

A exibição de ontem é consequência desta mantinha de desvarios. Nesse sentido, a vitória só poderia mesmo fazer-se por imaculada concepção, cortesia de Jovane, que, de coisa nenhuma, fez um golo que é tudo. De resto, tirando as arrancadas do cabo-verdiano, um par de defesas de Max, o acerto dos centrais, o voluntarismo de Acuña, e uma ou outra incursão de Wendel, não se aproveitou nada nem ninguém. Mas é na pré-época que se fazem experiências. E nunca a Liga me pareceu tanto uma pré-época oficial como agora.

11
Jun20

A Comunidade Científica Que Investigue

O Esférico

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A teoria da relatividade assume comportamentos bizarros nos jogos do Benfica e deveria, por si só, suscitar a preocupação da comunidade científica.

Entre o jogo da semana passada e o jogo de ontem em Portimão jogaram-se 17 minutos de tempo suplementar — 7' num e 10' noutro.

Assim à vista desarmada parece-me que há uma anomalia no eixo resultado-tempo que gravita à volta dos encarnados, na medida em que o tempo encolhe ou dilata-se consoante o resultado no marcador.

Resultados negativos parecem ter o efeito de dilatar os descontos e o número de remates para o ar de Dyego Sousa. Resultados positivos parecem ter o efeito de encurtá-los (como aconteceu nos últimos triunfos do Benfica — nos distantes tempos de D. Dinis — frente a Gil Vicente e Belenenses, em que os descontos se ficaram por uns austeros 4 minutos).

É estranho como a percepção das paragens do jogo se torna muito mais minuciosa nuns casos do que noutros.

Temo que, no futuro, uma eventual desvantagem no marcador implique mais 15 ou 20 minutos do imperdível espectáculo de Bruno Lage a contemplar, de mãos nos bolsos e olhar mortiço, a bainha do seu fato de treino Lacatoni.

É que a este ritmo de desaires o Benfica é capaz de chegar ao final da época com mais dois jogos inteirinhos nas pernas do que os restantes rivais — uma grave discriminação cronológica.

Entretanto, enquanto Vieira e Lage foram de mãos dadas ver o mar — quiçá em busca dum caminho marítimo para o Seixal desprovido de viadutos —, o líder encarnado conseguiu completar mais 24 horas sem pronunciar as palavras "claques" ou "No Name Boys" — um feito assinalável, dadas as circunstâncias.

06
Jun20

O Seráfico Benfiquista

O Esférico

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Deve ser uma felicidade ser do Benfica — uma das raras bênçãos desta vida. Imagino eu, que vivo do lado de cá do inferno uma existência abjecta, poluta, imoral e servil. Por acaso sou do Sporting, mas, para tamanha indigência espiritual, tanto faria que fosse do Porto, do Tondela ou do Farense — era igual.

Nós, vencidos do clubismo, olhamos de olhos esbugalhados e carentes para esse oásis de virtudes nos antípodas de Lisboa, muito como um sem-abrigo espreita o caviar dos ricos pela vitrine panorâmica do Ritz.

Invejamos esses píncaros de grandeza, cobiçamos essas iguarias de altivez. Enquanto reviramos os escombros da nossa miséria, imaginamos, ansiosos, como seriam as nossas vidinhas se vivêssemos todos nessa 'penthouse' de probidade em que os ditosos lampiões habitam. Como seriam se habitássemos esse mundo mágico, onde os adeptos se multiplicam mais rápido do que a taxa de natalidade mundial, os fetos nascem com superagentes, as investigações evaporam-se nos misteriosos bosques da justiça, os jornais ungem-nos diariamente dos mais doces encómios e os nossos beiços se banham perpetuamente em inesgotáveis fontes de óleo-de-courato...

Uma das grandes vantagens do Benfica, por exemplo, é não ter claques. Nunca tiveram. Dúvidas? Quem o diz, categoricamente, é Luís Filipe Vieira, o líder encarnado. "Claques? Nunca soube que o Benfica tinha claques". O que é extremamente vantajoso, convenhamos. Enquanto outros lidam com catástrofes animais como a de Alcochete, os benfiquistas podem, por exemplo, canalizar todos os seus esforços para a produção em massa de vouchers beneficentes (outra regalia do associativismo encarnado) ou passes VIP para as classes desfavorecidas de directores da PJ e juízes da Relação.

Quem, na absurda tentação de argumentar pela paz desportiva, não foi já interrompido por um benfiquista que, emergindo elasticamente de trás do seu impenetrável muro ético, nos esmaga com este xeque-mate heróico: "ao menos nós não temos Alcochetes!"? Como é bom ser do Benfica! Despreocupadamente, levianamente, altaneiramente do Benfica!

Mas, por detrás de todo o ecossistema celeste, espreitam perigos — como um corpo seráfico sem defesas bacterianas.

Tremo então só de imaginar o que seria se um grupo de malfeitores atacasse o autocarro da equipa com tijolos de betão densos como o Isaías. Isso seria tremendamente embaraçoso, quando o nobre líder já confirmou a inexistência de tais pessoas. Com alívio, portanto, os benfiquistas não têm que temer que os seus ídolos sejam hospitalizados com vidros nos olhos, ou que os líderes da equipa vejam as suas casas vandalizadas com ameaças em plena luta pelo título... Ainda assim, admito que não seria nada recomendável que a UEFA fechasse o Estádio da Luz pelo comportamento de claques ilegais a quem se desse apoio logístico em todos os jogos... E seria um tudo nada intrigante — confesso — que um clube visse o seu estádio interditado pela FPF depois de anos a encobrir grupos que — graças a Deus — não existem! Tal como não faria sentido mostrar surpresa quando uma claque que nós próprios declarámos extinta andasse por aí a atropelar, esfaquear, pontapear e emboscar adeptos de outros clubes, em virtude da cobertura clandestina que lhe prestámos ao longo dos tempos... Certo, seria chato, um tudo nada incómodo, admito, e um pesadelo de relações públicas internacional...

Sim, tudo isso seria uma pena, uma terrível e fatal ironia. E — quase me atrevo a dizer — motivo para demissão colectiva e humilhação generalizada.

Felizmente, não há quaisquer indícios de que tal esteja para acontecer. O Benfica não tem hoje, nem nunca teve, claques. O que aconteceu nunca aconteceu. E, assim, o seráfico adepto benfiquista pode prosseguir a vida, confortavelmente embalado nos braços da grã-ventura.

05
Jun20

Futebol de Origem // V. Guimarães 2 Sporting 2

O Esférico

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Foi virado do avesso que o campeonato português regressou, aturdido por três meses de pandemia, recortes de violência extra-relvados, guerras intestinas nos bastidores e ecos de distopia nas bancadas nuas. Quem poderia adivinhar, após cinco jogos de retoma, que os únicos vencedores seriam, não Sporting, Benfica ou Porto, mas Famalicão e o aflito Portimonense? A ordem do futebol colapsou. O mundo está ao contrário.

Nesse sentido, a sabedoria convencional saiu de campo tão desconchavada como tudo o resto. Durante semanas, ouvimos todos dizer que futebol sem adeptos não fazia sentido. Que a retoma da Liga era uma loucura. Que jogar após tão longa paragem seria impossível. Mas o apito soou, a bola rolou, e quando isso sucedeu só ficou no ar a alegria dos jogadores e o entusiasmo dos adeptos, cada qual no seu poleiro. O futebol aconteceu, como num pelado escolar, reduzido à mais pura expressão de movimento, camaradagem e competição. Sem ruído, sem distracções, sem truques de circo, as figuras tristes ficaram para aqueles que, de fora, reclamam sobre a modalidade uma autoridade desproporcionada — prova de que o mal do desporto não jaz nos seus executantes, como tantas vezes no-lo querem fazer crer, mas sim na economia de bajuladores que vivem da poeira que eles próprios levantam: presidentes, empresários, comentadores, claques.

Para o Sporting, regressar aos relvados nestas circunstâncias constituiu uma novidade refrescante. Sem a Juve Leo no topo sul a amolar as navalhas desde o 1º minuto, e sem a turba vimaranense a proporcionar a habitual salva de cadeiras e escarretas, o colectivo leonino entrou em campo ligeiramente encandeado pela nudez insólita de tudo, por instantes confuso com as dimensões gigantescas que a bola — e apenas a bola — tomou perante um mundo em retirada.

Ainda assim, passado o bluff inicial do adversário, o futebol dos leões oscilou sempre entre o matreiro e o ponderado, o sábio e o distraído, com alguns momentos de entendimento promissor, embalado por uma condição física invejável para quem reduzira a sua actividade física, nos últimos dois meses, a um regime de viagens achineladas entre o frigorífico e o bidé.

Se o Sporting titubeou, o mesmo se deveu a pecados como o egoísmo juvenil de alguns homens dianteiros, cerimónia defensiva ou o estranho vírus que tem afectado os guarda-redes — de todos os intervenientes os mais estáticos, e talvez por isso os mais susceptíveis a inalarem a apatia que soprava do lado das bancadas.

Falhas, mas falhas perfeitamente entendíveis à luz das circunstâncias, e, não obstante, insuficientes para ensombrarem a afirmação inequívoca de Sporar, as estreias positivas de Quaresma e Matheus, ou a exibição fulminante de Jovane.

Para quem esperava que o futebol fosse hoje uma coisa diferente, a surpresa deverá ser como este tem a capacidade de sobreviver nos cenários mais improváveis, e a forma como estamos a reaprender a apreciá-lo à luz dos seus pergaminhos originais.

Já para o Sporting, este ambiente de pré-época era exactamente o que faltava a um clube a precisar de pacificação e um treinador a precisar de tempo para reordenar prioridades antes de uma época seguinte que será inevitavelmente moldada à imagem das restrições emergentes.

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