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O Esférico

Página independente de apoio ao Sporting Clube de Portugal. Opinião * Sátira * Análise * Acima do Sporting Mais Sporting

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O Esférico

12
Set20

Comissão de Desonra

O Esférico

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Às vezes tenho que ler certas coisas duas vezes, porque o grau de surrealismo não cabe todo numa primeira leitura.
 
Até à data, Luís Filipe Vieira, e a SAD que dirige, são arguidos no caso "Saco Azul", que envolve branqueamento de capitais e fraude fiscal. A investigação dos e-mails continua a decorrer. Assim como a investigação relativa aos Vouchers. Luís Filipe Vieira é arguido — e prepara-se para ser acusado — na Operação Lex, onde há fortes indícios de que terá tentado comprar um juiz. Repito: comprar um juiz! Há ainda o caso e-toupeira, do qual Vieira e a SAD encarnada saíram "inexplicavelmente" ilesos, mas cuja acusação atingiu o seu braço direito, Paulo Gonçalves, que hoje enche a conta bancária em todo o tipo de negócios com o Benfica. Prosseguem também as investigações no âmbito dos jogos viciados em 2015/2016, assim como do Mala Ciao. A somar a isto, Vieira é ainda arguido por suspeitas de ter burlado o BPN, e vê-se agora implicado no Lava Jato brasileiro, num caso de corrupção que envolve a Odebrecht e a Doyen.
 
Sabemos que o antigo ladrão de camiões é "recomendável" quando elencamos uma lista dos seus crimes — consumados ou alegados — e não temos a certeza se nos escapou alguma coisa.
 
Tudo isto é público.
 
Como pode, então, um primeiro-ministro dum país integrar a Comissão de Honra para a recandidatura de tal personagem? Como é que isto é possível!? Como pode António Costa, cuja solenidade do cargo que ocupa deveria recomendá-lo a um distanciamento higiénico de tudo o que fede a trampa, emprestar o seu nome a este exercício de branqueamento reputacional? Já poucas coisas me chocam, mas isto é chocante. E preocupante.
 
Quando finalmente arrastarem Luís Filipe Vieira em algemas, um dia destes, virá António Costa dizer que não se tinha apercebido de nada de anormal, não estava ao corrente de nada? Não me surpreenderia. Afinal, falamos da mesma pessoa que andou com Sócrates pela mão, governou com Sócrates, rebolou no feno com Sócrates, mas nunca topou o distinto cheirinho a podridão de Sócrates. Neste concubinato de "ministros" já se torna difícil perceber quem é, afinal, o "primeiro".
 
Uma Comissão de Honra que é uma desonra capital para quem a integra, mas sobretudo para quem ocupa altos cargos governativos e autarcas. É o triunfo da cultura do "quero, posso e ninguém tem nada a ver com isso".
26
Jul20

Nasceu Torto // Benfica 2 Sporting 1

O Esférico

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O Benfica ainda deu 5 minutos de avanço, cedendo à nação leonina uns raros vislumbres de tele-entusiasmo com um par de arrancadas na direcção da baliza de Vlachodimos. Mas não foi preciso esperar muito até que a máscara caísse ao Sporting, revelando os seus verdadeiros objectivos para o derby.

Para o Sporting, aquilo parecia um treino específico cujos objectivos se resumiam a passar para o sítio errado, correr para buracos insofismáveis e atirar os braços ao ar em esbaforida consternação, numa tentativa de estudar os diferentes vectores do falhanço. Face à pressão alta do Benfica, e com poucas linhas de passe, os centrais leoninos responderam à abstrusa responsabilidade de saírem com bola com incompetente diligência, missão que cumpriram religiosamente durante cerca de 35', durante os quais entregaram a bola ao adversário — sem exagero — mais de 10 vezes junto à grande área (e às vezes dentro dela). E, enquanto os pupilos de Amorim cumpriam rigorosamente a inovadora metodologia, as ocasiões sucediam-se para os encarnados, até que o golo de Seferovic surgiu, não como uma punhalada súbita, mas como o fim lógico de um longo obscurecimento de faculdades.

Perante isto, qualquer treinador, confrontado com esta falta de soluções, teria ordenado aos seus defesas que, no mínimo, despejassem a bola na frente, em vez de a entregarem nataliciamente aos rivais. Mas não Amorim — e é por isso que gosto dele. A coerência é uma qualidade que prezo muito. Se a perdem cinco vezes, também a podem perder vinte. Não tem preço a fidelidade a um certo estilo de jogo.

Na 2ª parte, contudo, os pressupostos do jogo mudaram ligeiramente. As perdas de bola infantis continuaram a ser compulsórias, mas a entrada de Tiago Tomás, um Wendel mais cooperante com a saída de jogo, e um futebol mais directo a partir da retaguarda, permitiram que o Sporting rechaçasse o Benfica para terrenos mais inférteis e impusesse ao jogo as presenças até aí anódinas de Jovane e Sporar — tendo este último marcado no único toque decente que teve em toda a partida, após cirúrgica assistência de Tomás. Foi durante esses 25/30 minutos que o Sporting mostrou o seu melhor futebol, permitindo arrancar ao marasmo inicial exibições reconfortantes de Matheus, Nuno Mendes e Wendel, assim como o contributo precioso de Ristovski (eficaz a fechar, pressionante a subir) e Luís Neto (um oásis de experiência que evitou um descalabro prematuro).

Infelizmente, talvez sem o saberem, já estavam em marcha os acontecimentos que atirariam o Sporting para o 4º lugar, mercê da exibição pírrica frente ao Setúbal, à qual a reviravolta bracarense frente ao Porto e as graduais cedências da imaturidade leonina à eficácia benfiquista perto do fim apenas vieram amargar o travo de fatalismo que nos persegue, e que parece sempre óbvio à distância.

Acabou derreado o que nasceu torto. Ainda assim, este jogo não deixa de ser uma lição de matemática valiosa. Se "o mesmo" só chega para 30 minutos de futebol competitivo, "mais do mesmo" para 30 minutos chegará. Há quem saiba fazer contas destas na SAD?

P.S.: eu não páro de avisar: escorregadelas antes do Benfica dá derrota com o Benfica. Entre aquela gente toda, não creio que haja uma grama de noção histórica.

18
Jul20

A Sem Vergonha Tem Um Novo "Dream Team"

O Esférico

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"Ad captandum vulgus, panem et circenses". Assim explicou o imperador Vespasiano a sua relação com a plebe ululante. Para enganar o povo dêem-lhe pão e circo.

Mesmo com o nacional hábito de contar milhões a voar, já me é difícil saber o que o Benfica tem mais: jogadores com contrato ou casos na justiça. Tragicamente, enquanto sai ou não sai uma acusação, sai ou não sai uma condenação, o manto do "alegado" alumia o caminho do bandido. É longo e largo em Portugal, este manto. Enquanto fulano é "alegado", e não "acusado" ou "culpado", tem tempo para ganhar três campeonatos, comprar sete juízes e apertar dez gasganetes, com o beneplácito da turba alucinada (sim, a mesma turba que reclama justiça e probidade de manhã à noite).

Atentemos às últimas movimentações de Vieira. Para ele, é óbvio que a sua sobrevivência pessoal joga-se nas eleições, não nos tribunais — evidência da dificuldade que a justiça tem em penetrar no fenómeno desportivo. Nesse sentido, Jesus é a cartada que lhe faltava para garantir uma vitória folgada nas urnas. Em nome desse desígnio, quebram-se todas as promessas, enterram-se todos os planos. Que a situação é desesperada indica-o o facto de o mesmo LFV, há pouco tempo atrás, ter jurado que JJ jamais voltaria ao Benfica com ele a presidente. Mas Vieira sabe o que os adeptos do clube secretamente cobiçam. Na gaveta fica qualquer pretensão de projecto desportivo — algo que, tirando a consolidação do seu poder, nunca realmente teve.

É que no Benfica, como noutros clubes, o cheirinho a foguetório é o maior mata-escrúpulos que há. Isso mesmo ficará tristemente exposto em Outubro, quando milhares rumarem à Luz para colocarem o seu voto no ilustre sócio do Sporting, repudiando anos de pudores morais, exaltações éticas e indignações judiciais (ah, saudosos anos 2000). Para o mal e para o pior, o benfiquismo que brandiu valentemente a espada contra os apitos dourados recolhe agora ao estábulo em ovina procissão, cansado e apascentado, pedindo apenas que não mais seja incomodado por ninharias como legalidade ou transparência. Se Vieira faz 'all-in' na entronização de Jesus, o benfiquismo faz 'all-in' na falência ética. O espectáculo de uma alma que se dá à vilanagem a troco de uns vagidos futebolísticos é, de facto, uma coisa abjecta.

A abjecção está em todo o lado, por estes dias. E o que não falta é uma procissão interminável de engolidores de sapos a exibirem os seus invertebrados dotes na tv. Dos bons, dos ginastas, dos reptilíneos — daqueles que aterram sempre em pé...na poça de lama. Ele é a guarda avençada que se dedicou, ininterruptamente, a emporcalhar Jorge Jesus desde o dia em que assinou pelo Sporting. Ele é as eminências pardas do califado, cujo carinho mais suave que dedicaram a Jesus nesses distantes anos foi "traidor"... Se somente esta malta tragasse o Covid como tragam a própria dignidade, a pandemia teria os dias contados...

Admito, os maiores sapos estarão mesmo reservados para os protagonistas desta história. Para o Benfica liderado por Vieira, que, entre outras coisas, acusara o bom Jorge de ser um ladrão de computadores, de atacar jogadores por SMS, de ser mercenário, 'pesetero' e pilha-galinhas. Um homem tão vil que, naturalmente, era inteiramente merecedor do processo de indemnização de 14 milhões (1 euro por cada "simpatizante...") que lhe moveram, ou do arresto do último salário a que tinha direito... Tamanha paixão jamais se vira na canibalização furibunda de um técnico que lhes deu 10 títulos. Não obstante, quando atravessar as portas da Luz, o treinador mais abjecto do mundo, o destruidor de jovens, voltará a ser o melhor treinador do mundo, o fazedor de carreiras. Como a Cinderela, o valor está no sapatinho que a propaganda lhe quiser calçar.

O outro sapo papa-o Jesus, que, para fugir do Brasil, se conforma em regressar a um clube que o aviltou como nenhum outro na carreira. Fá-lo poucos dias depois de ter renovado com o Flamengo, a sangue frio, como um larápio que se some na noite. Este comportamento, como a abdicação de princípios que o acompanha, seria em qualquer outro ramo da vida considerado uma desvergonha apensa a práticas de lupanário. No futebol deram-lhe outro nome: "profissionalismo". E, por isso, o nosso futebol — que é tosco — acerta o passo com a dimensão moral desta gente — que é nula.

Objectivamente, o Benfica passa a contar com o melhor treinador português da actualidade, cujas capacidades admiro. O campeonato português fica mais divertido. Mas 2020 não é 2010. E o trambolhão abrupto do Benfica na época que agora termina não se explica por um misterioso apagão desportivo, mas sim por uma gangrena funda que corrói os pilares do império vieirista. Antes, o "limpinho limpinho" trazia ainda o cheiro da lixívia usada para limpar o local do crime. Mas o "limpinho limpinho" de hoje traz só agarrado o fedor pútrido dos cadáveres que a justiça vai desenterrando no quintal do Vieirismo. O trajecto de Jesus adivinha-se mais conturbado desta vez. E o rasto de animosidades entre o técnico e o seu novo empregador é um arsenal abundante que os rivais hão-de aproveitar. Quanto ao Sporting, tem como missão mostrar que, afinal, "conta para o campeonato".

17
Jun20

O "Comandante" Weigl

O Esférico

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É nítido que os jornais desportivos hoje mais não são que "moços de recados" dos gabinetes de comunicação dos grandes clubes. Em suma, um desperdício de tempo e dinheiro.

Sem qualquer pudor que lhe acuda, o jornal "A Bola" assume-se orgulhosamente como o fiel escudeiro desse viveiro de suspeitas a que ainda hoje chamamos, piedosamente, Benfica.

Weigl foi propalado como o grande sucesso de bilheteira de Janeiro. Para não destoar, o Benfica desembolsou uns exorbitantes 20M pelo petiz.

Não posso deixar de notar, contudo, que desde a chegada do alemão os resultados do Benfica têm caído a pique. Se, numa primeira fase, o Benfica acumulara 20 vitórias, 4 empates e 4 derrotas, após a entrada do ex-Dortmund os registos estancaram numas agonizantes 7 vitórias, 6 empates e 3 derrotas. Pré-Weigl: 2.28 pontos por jogo. Pós-Weigl: 1.68 pontos por jogo.

Algo não correu bem nos cálculos. E, a julgar pelos resultados, o contabilista da obra foi o mesmo que arquitectou o saudoso RDT.

A opinião dum Sportinguista confesso é uma coisa. Mas acontece que este pormenor não escapou ao, por estes dias, olhar cortante dos adeptos encarnados, que não se furtaram a mencionar esse facto, não obstante as odes marítimas trauteadas à ceia pelo despreocupado Lage.

Por isso mesmo, com a devida diligência, os amigos de "A Bola" dedicam hoje a sua primeira página à nobre arte de polir nabos. É preciso relembrar que, melhor do que ganhar jogos, o que importa é que o sr. 20 milhões pegou no "comando" do navio — mesmo que o navio seja uma chalupa em naufrágio acelerado.

11
Jun20

A Comunidade Científica Que Investigue

O Esférico

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A teoria da relatividade assume comportamentos bizarros nos jogos do Benfica e deveria, por si só, suscitar a preocupação da comunidade científica.

Entre o jogo da semana passada e o jogo de ontem em Portimão jogaram-se 17 minutos de tempo suplementar — 7' num e 10' noutro.

Assim à vista desarmada parece-me que há uma anomalia no eixo resultado-tempo que gravita à volta dos encarnados, na medida em que o tempo encolhe ou dilata-se consoante o resultado no marcador.

Resultados negativos parecem ter o efeito de dilatar os descontos e o número de remates para o ar de Dyego Sousa. Resultados positivos parecem ter o efeito de encurtá-los (como aconteceu nos últimos triunfos do Benfica — nos distantes tempos de D. Dinis — frente a Gil Vicente e Belenenses, em que os descontos se ficaram por uns austeros 4 minutos).

É estranho como a percepção das paragens do jogo se torna muito mais minuciosa nuns casos do que noutros.

Temo que, no futuro, uma eventual desvantagem no marcador implique mais 15 ou 20 minutos do imperdível espectáculo de Bruno Lage a contemplar, de mãos nos bolsos e olhar mortiço, a bainha do seu fato de treino Lacatoni.

É que a este ritmo de desaires o Benfica é capaz de chegar ao final da época com mais dois jogos inteirinhos nas pernas do que os restantes rivais — uma grave discriminação cronológica.

Entretanto, enquanto Vieira e Lage foram de mãos dadas ver o mar — quiçá em busca dum caminho marítimo para o Seixal desprovido de viadutos —, o líder encarnado conseguiu completar mais 24 horas sem pronunciar as palavras "claques" ou "No Name Boys" — um feito assinalável, dadas as circunstâncias.

06
Jun20

O Seráfico Benfiquista

O Esférico

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Deve ser uma felicidade ser do Benfica — uma das raras bênçãos desta vida. Imagino eu, que vivo do lado de cá do inferno uma existência abjecta, poluta, imoral e servil. Por acaso sou do Sporting, mas, para tamanha indigência espiritual, tanto faria que fosse do Porto, do Tondela ou do Farense — era igual.

Nós, vencidos do clubismo, olhamos de olhos esbugalhados e carentes para esse oásis de virtudes nos antípodas de Lisboa, muito como um sem-abrigo espreita o caviar dos ricos pela vitrine panorâmica do Ritz.

Invejamos esses píncaros de grandeza, cobiçamos essas iguarias de altivez. Enquanto reviramos os escombros da nossa miséria, imaginamos, ansiosos, como seriam as nossas vidinhas se vivêssemos todos nessa 'penthouse' de probidade em que os ditosos lampiões habitam. Como seriam se habitássemos esse mundo mágico, onde os adeptos se multiplicam mais rápido do que a taxa de natalidade mundial, os fetos nascem com superagentes, as investigações evaporam-se nos misteriosos bosques da justiça, os jornais ungem-nos diariamente dos mais doces encómios e os nossos beiços se banham perpetuamente em inesgotáveis fontes de óleo-de-courato...

Uma das grandes vantagens do Benfica, por exemplo, é não ter claques. Nunca tiveram. Dúvidas? Quem o diz, categoricamente, é Luís Filipe Vieira, o líder encarnado. "Claques? Nunca soube que o Benfica tinha claques". O que é extremamente vantajoso, convenhamos. Enquanto outros lidam com catástrofes animais como a de Alcochete, os benfiquistas podem, por exemplo, canalizar todos os seus esforços para a produção em massa de vouchers beneficentes (outra regalia do associativismo encarnado) ou passes VIP para as classes desfavorecidas de directores da PJ e juízes da Relação.

Quem, na absurda tentação de argumentar pela paz desportiva, não foi já interrompido por um benfiquista que, emergindo elasticamente de trás do seu impenetrável muro ético, nos esmaga com este xeque-mate heróico: "ao menos nós não temos Alcochetes!"? Como é bom ser do Benfica! Despreocupadamente, levianamente, altaneiramente do Benfica!

Mas, por detrás de todo o ecossistema celeste, espreitam perigos — como um corpo seráfico sem defesas bacterianas.

Tremo então só de imaginar o que seria se um grupo de malfeitores atacasse o autocarro da equipa com tijolos de betão densos como o Isaías. Isso seria tremendamente embaraçoso, quando o nobre líder já confirmou a inexistência de tais pessoas. Com alívio, portanto, os benfiquistas não têm que temer que os seus ídolos sejam hospitalizados com vidros nos olhos, ou que os líderes da equipa vejam as suas casas vandalizadas com ameaças em plena luta pelo título... Ainda assim, admito que não seria nada recomendável que a UEFA fechasse o Estádio da Luz pelo comportamento de claques ilegais a quem se desse apoio logístico em todos os jogos... E seria um tudo nada intrigante — confesso — que um clube visse o seu estádio interditado pela FPF depois de anos a encobrir grupos que — graças a Deus — não existem! Tal como não faria sentido mostrar surpresa quando uma claque que nós próprios declarámos extinta andasse por aí a atropelar, esfaquear, pontapear e emboscar adeptos de outros clubes, em virtude da cobertura clandestina que lhe prestámos ao longo dos tempos... Certo, seria chato, um tudo nada incómodo, admito, e um pesadelo de relações públicas internacional...

Sim, tudo isso seria uma pena, uma terrível e fatal ironia. E — quase me atrevo a dizer — motivo para demissão colectiva e humilhação generalizada.

Felizmente, não há quaisquer indícios de que tal esteja para acontecer. O Benfica não tem hoje, nem nunca teve, claques. O que aconteceu nunca aconteceu. E, assim, o seráfico adepto benfiquista pode prosseguir a vida, confortavelmente embalado nos braços da grã-ventura.

05
Mar20

Pára o Baile

O Esférico

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O recentemente falecido Vasco Pulido Valente deixou-nos estas palavras, escritas em 2006, as quais assentam que nem uma luva aos factos ontem ocorridos:

«Na história do Apito Dourado, por exemplo, o ponto mais típico e revelador, no fundo, o ponto mais português, não é o descaramento ou o cinismo, é o tom de intimidade, às vezes, de verdadeira estima da conversa. "Ó pá, ó fulano, ó amigo", repetem os vários vigaristas com um inconfundível calor de família. E, num certo sentido, são mesmo pessoas de família, que durante anos se ajudaram, se aldrabaram ou zangaram para maior glória do futebol. Torcer uma regra ou subornar um árbitro entra numa velha rotina, que já ninguém considera estranha ou condenável.
No caso do Apito Dourado, a "escuta" abalou a tradição. Um acidente sem grande importância. Em Lisboa inteira, e suponho que em Portugal inteiro, os donos da economia, do sector público e do sector privado jantam e almoçam em público, com inteiro sossego, para trocar "informação interna" ou traficar influência. [...] Como o patriótico pessoal do futebol, também eles se conhecem: da faculdade, de uma empresa, de um governo qualquer. Pior (ou melhor) ainda: a mulher do A é cunhada do C, o filho do B casou com a sobrinha do F, e por aí fora, sempre à volta. Uma palavrinha aqui, um favorzinho ali, não lhes parece nada de extraordinário. [...] Uma sociedade pequena e pobre (e, por cima, católica) gera necessariamente corrupção. O número, o anonimato e a distância reforçam o rigor; a estreiteza, a convivência e a proximidade criam o mundo paralelo dos "compadres".»

Se há acaso feliz que decorre das novidades de ontem, esse tem a ver com a transversalidade das suspeitas. Não há argumento exculpante para o típico adepto obtuso, que por defeito vê em qualquer investigação individualizada o focinho odioso de uma obscura conspiração contra o seu clube de eleição. A malta, na miséria partilhada, torna-se mais mansa, mais convidativa à justiça. "Está bem, se tu vais ao fundo, eu também não me importo de ir", lá confessam, a esforço. Porque também o futebol português habita neste microcosmos de pulhice contagiosa, em que os seus protagonistas se infectam mutuamente de esquemas transmitidos a passou-bens no terraço do Ritz, não surpreende que o mais pequeno pontapé numa pedra revele logo, sem esforço, uma ninhada de lacraus. Para uma investigação tecida durante 5 longos anos, é natural que vá tudo na rede.

Sem surpresa, os suspeitos do costume coleccionam mais um dia em tribunal. Pinto da Costa, Vieira, Salvador, Bruno de Carvalho, Carlos Pereira, etc. Está lá a corja (quase) toda. Têm o medalheiro cheio, não é difícil imaginá-los a partilharem com os netos, galhofeiros, a história de cada acusação. "Olha, esta ganhei por causa duns chocolatinhos que ofereci a fulano... escapei-me por pouco por uma viela processual", diz um. "Esta foi quando roubei um camião. Não fosse a amnistia do doutor...", afiança outro. Previsivelmente, estão todos satisfeitíssimos por "colaborar com a justiça". Do alto do pagode, declaram-se todos inocentíssimos. Não fosse a terrível maçada das trafulhices, colaborariam com a justiça até nas horas vagas, eu sei... É como a velha história do peido: cheira mal, mas ninguém se acusa.

O nomeado-surpresa da noite foi mesmo Varandas. Por casos que, alegadamente, dizem respeito ao mandato de BdC, por fado fatal ou vontade própria, a verdade é que embarca na sua primeira "travessia do arguido". Para ele também fica a lição: não há dama que arremeta dois virtuosos passos pelo pantanal lusitano sem imediatamente ficar com os saiotes salpicados de lama. Foi a sua estreia, e talvez não seja a última.

Quanto a mim, é motivo de regozijo sempre que a justiça sacode a poeira dos manuais. Há muito que esta pocilga precisa duma varridela geral.

18
Jan20

Fumo No Porão // Sporting 0 Benfica 2

O Esférico

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Havia uma escola que frequentei quando era mais novo que organizava todos os anos um torneio de futebol inter-turmas. Tratava-se duma ocasião especial, pela qual esperávamos ansiosamente. E embora apenas participassem os alunos mais "veteranos", os mais novos, como eu, tomavam fervorosos partidos por esta ou aquela equipa, gerando uma euforia participativa que redundava num ambiente de jogo a sério em redor do campo. Uma das singularidades deste evento consistia na existência dum 'speaker', que se posicionava num palanque improvisado sobre a linha de meio campo — um bom malandro com ar de Spirou que não só anunciava resultados e substituições, como também interpunha bicadas satíricas sempre que achava conveniente. Lembro-me perfeitamente dum desses jogos, em que certa Equipa A abafava certa Equipa B, o massacre já ia penoso, até que a partir dos 6-0 cada novo golo era aproveitado pelo 'speaker' para se dirigir aos vencidos num tom de refinado sarcasmo: "coragem, ainda não acabou..." A ironia era óbvia: aquilo que se mascarava de estímulo para os humilhados era na realidade a sádica promessa de mais golos no bucho. E toda a gente ria.

Esta época fez-me recordar esse episódio. Algures, atrás dum pilar, há sempre uma vozinha jocosa que não pára de nos atirar o mesmo piropo: "ainda não acabou..." Efectivamente, ainda há tempo mais que suficiente para as coisas piorarem. Escusado será dizer, uma equipa com estas crateras estruturais não vai a lado nenhum na Liga Europa. A Taça de Portugal já foi e a Taça da Liga prepara-se para tomar o mesmo rumo. A meio do campeonato, são 19 os pontos que nos separam do líder. A Champions é uma miragem, o Famalicão deverá fugir no 3º lugar, e o Braga já nos morde os calcanhares no 5º. O Sporting não caminha para o pódio, caminha para ficar fora da Europa.

Não se pode dizer que tenhamos jogado propriamente mal ontem, assim como não se pode dizer que tenhamos chegado a jogar bem. Fomos uma equipa equilibrada dentro do possível, mas qualquer olhar atento aos jogadores das duas equipas em aquecimento aos 60' chegava para concluir que os equilíbrios negociados dentro de campo podiam ser ilusão rapidamente desfeita a qualquer instante. Dum lado, Rafa, Taarabt ou Seferovic; do outro Plata, Mendes, Eduardo, Borja. Dum lado homens feitos, do outro rapazes e flops. À maior consistência encarnada, o Sporting soube responder com duas ou três oportunidades claras. E, à semelhança do que já acontecera contra o FCP, períodos houve em que a assertividade leonina chegou a entusiasmar a plateia. Mas no fim venceu o Benfica, porque tem melhor futebol e, sobretudo, melhores jogadores nos momentos de definição e concretização.

Pois estes grandes jogos são como o algodão: não enganam. E assim, onde atletas como Max, Fernandes ou Mathieu responderam com graus variáveis de qualidade sempre que foram chamados a intervir, outros como Wendel, Doumbia ou L. Phellype viram a sua flagrante mediania brutalmente exposta por um adversário hábil em explorar este superavit de fragilidades — a começar pelo miolo, onde os raros laivos de construção sustentada não chegaram para compensar uma crónica lentidão e confusão na definição dos lances.

Tal como, infelizmente, preconizei, o mês de Janeiro prepara-se para ser o dilúvio que vai rebentar com os diques de Alvalade. Nesta lua de fel em curso, sugiro algumas coisas muito concretas:

1) Os resultados tornam cada vez mais urgente que esta direcção submeta a escrutínio eleitoral a teoria de que é particularmente dextra em gestão futebolística — afinal, a principal premissa da sua então candidatura.

2) Esteja mais uma semana, um mês ou um ano à frente do clube, FV deve concluir o saneamento das claques, nomeadamente através das propostas que eu já aqui expus: a) expulsão/extinção de todas as claques, ou substitui-las por uma claque oficial do clube; b) retirada da bancada inferior do topo sul aos GOA.

3) É necessário que se comece a preparar a sucessão de Silas. Independentemente do seu grau de culpa, os resultados são pobres, a sua competência é apenas mediana, e um treinador que nem pode falar com os jogadores não é seguramente o futuro do Sporting. Deixemo-nos de ideias tolas.

30
Set19

Vieira: Há Um Diabo de Gaia Em Todos Nós

O Esférico

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Luís Filipe Vieira, o huno-estadista, voltou a atacar. Desta feita, quando anunciava novas tvs e micro-ondas para toda a gente, foi violentamente interpelado por um sócio que se atreveu a pedir-lhe o recibo, por favor. Claro que agora é fácil condenar a sua reacção. Mas as pessoas esquecem-se que, como ex-guerrilheiro das estradas, Vieira sofre de um quadro clínico pós-traumático que se manifesta através de sonhos místicos e surtos psicóticos. Vieira viu muita coisa. É preciso ver muita coisa para se saber o que se deve tirar. Vieira é, portanto, uma vítima. Vítima do seu sucesso, como o próprio já esclareceu.

O Dr. Aspirina Barreto, director do Núcleo de Cleptómanos Politraumatizados, descreve-o deste modo: "não é raro uma pessoa como Luís Filipe Vieira — alguém que fez a sua formação profissional na alta roda dos assaltos à mão armada — vir depois a sofrer, na sua transição de ladrão de camiões para burlão de camarote, de uma cisão de personalidade que o remete para estados de alucinação frequentes. É muito provável que o Sr. Vieira, ao ver-se confrontado por alguém que apelava ao eixo ético que o Sr. Vieira não possui, tenha regredido para um desses estados psicóticos, e aquilo que todos viam como um sócio normal a usar do seu direito à palavra, Vieira tenha visto como um juiz-de-linha a colocá-lo fora-de-jogo. Todos temos um Diabo de Gaia dentro de nós!"

Vieira largou então o pacote de Lay's para arejar os colarinhos dum perigosíssimo arruaceiro. Um acto de bravura! Ou, como diria Scarface, "say hello to my little friend!" Sabe Deus que outra letal oratória esse sócio estaria prestes a disparar sobre a multidão inocente?

Tudo isto, obviamente, insere-se no plano de remodelação da Luz. LFV nunca teve medo de meter mãos à obra, mesmo em trabalhos sujos. Sobretudo em trabalhos sujos. E assim não perdeu tempo, dando o exemplo limpando a área em redor do toupeiral, onde alguns sujeitos mal intencionados andavam a procrastinar, exigindo transparência e outras modernices. A nova Luz começa a ganhar forma. Já era aflitivo não saber onde pôr todo aquele staff da FPF e do Campus de Justiça. Naquelas cadeiras que estão sempre desertas atrás das balizas não pode ser. Ficam tão longe do centro de decisão... O melhor é mesmo aumentar a lotação. Com este voluntarismo, aquilo num instante passa dos 15 mil para os 30 mil convites por jogo. Com jeitinho ainda conseguem meter lá toda a família do Carlos César e ainda manterem as cadeiras atrás das balizas vazias, para não distrair os espectadores dos golos do De Tomás. Há um plano para tudo e Vieira, o betão-man, é o homem certo para concretizá-lo. Quanto à verdade, essa, pode ficar de pé, espremida dentro da caixa de segurança, para não se atrever a interromper o circo.

P.S.: O que diz o regulamento do Benfica sobre presidentes que agridem sócios? O Benfica tem um Conselho Disciplinar? E o escrutínio da imprensa, ficar-se-á por uns vídeos foscos revelados à luz do iPad? O que é mais grave, Bruno Fernandes dar uns safanões numa porta ou o presidente dum clube que recebe na tribuna primeiros-ministros e juízes bater noutra pessoa por delito de opinião?

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