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O Esférico

Página independente de apoio ao Sporting Clube de Portugal. Opinião * Sátira * Análise * Acima do Sporting Mais Sporting

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O Esférico

19
Mar20

Rafael Leão Contra-Embucha

O Esférico

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Desde o descalabro de Alcochete, uma ideia acima de todas tem norteado a minha conduta sobre essa matéria: não tecer julgamentos de valor sobre os jogadores que estavam lá naquele dia, entre todos o mais infame da história do SCP.

Para esse posicionamento contribui a noção inatacável de que as vítimas foram os atletas — eles e a instituição. Não pessoa A, B ou C, lista D, E ou F, destituído fulano ou destituído sicrano.

A nós não nos cabe o papel de psiquiatras do diabo. Cada qual é um indivíduo singular e complexo, moldado num conjunto de idiossincrasias que o distingue dos demais. Do mesmo episódio de violência podem resultar desfechos vários, todos eles plausíveis: pânico para uns, recalcamento para outros, oportunismo para este, solidariedade para aquele, redenção aqui, recriminação acolá, traumas ou superação — e ainda "é chato", para alguns.

O grupo de jogadores que rescindiu com o clube nunca foi um grupo coerente (nem poderia sê-lo). Uns, como William ou Patrício, desde cedo pugnaram por um acordo com o Sporting. Outros regressaram e honraram a camisola. No caso de Rafael Leão, entre as razões que invocou para rescindir e a forma usurária como andou a oferecer o lombo pelos "mercados de carne" em 2018, deixou um espaço grande para o nascimento de azedumes tribais, como aqui dei conta em texto escrito a 08/08/18 (as dúvidas sobre a sua carreira não se confirmaram, mas o resto do texto permanece estranhamente actual).

Desde cedo, os especialistas viam o processo contra Leão como o mais forte do Sporting. Por não ter sido mencionado nas mensagens de Whatsapp, por não ter sido um alvo premeditado, por não ter sido directamente atacado. O seu comportamento posterior é, sobretudo, indicativo de um jovem deslumbrado e mal aconselhado, mas também contraditório naquilo que foi o seu quase regresso ao Sporting e a sua poli-traumatizada fuga do Sporting. A FIFA recusou-se a apreciar o caso, mas, num contra-golpe inesperado, o TAD veio dar razão ao SCP. Leão irá recorrer, sem dúvida, mas a chapada está dada.

Porém, ao contrário do que uns poderão pensar, esta decisão apenas vem justificar a acção atempada, quer da Comissão de Gestão, quer da SAD eleita. O Sporting pedia 45M de indemnização, o TAD decidiu-se por 16M — um terço do valor. Isto, "no caso mais forte que o Sporting tinha". E apenas chegámos a este ponto porque tanto o jogador como o Lille sempre se recusaram a negociar. Com um acordo oportuno, o clube teria provavelmente encaixado valores aproximados, mas numa altura bem mais vital.

Com recursos e contra-recursos, não é provável que o Sporting veja a cor da grana no próximo ano. Para se salvar, o Sporting precisava de liquidez para ontem, não para hoje (2 anos depois), ou para amanhã (4 anos depois). Volto a sublinhar: a acção decisiva da CG e da SAD foi o que evitou que o clube entrasse em incumprimento e acabasse na bancarrota. Isto é um mimo para o nosso orgulho, mas não muda nada.

09
Mar20

Palmadinha Psicológica // Sporting 2 Aves 0

O Esférico

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Parte do encanto das mudanças de treinadores reside na folclórica "chicotada psicológica", um safanão de poeiras que deixa toda a gente na sala aflita das alergias durante umas horas, numa agitação pulmonar que chega a ser confundida com vigor e irreverência física. Ainda que os efeitos a longo-prazo de tais mudanças sejam questionáveis, muitas vezes os efeitos imediatos cumprem o seu propósito. No SCP, por exemplo, Inácio ganhou um campeonato, Bento finalizou 05/06 no 2º lugar, Sá Pinto derrubou o Man. City e mesmo o sucinto Keizer chegou a convencer parte das bancadas de que, a partir dali, Alvalade seria uma espécie de bar aberto de onde todo os solteirões sairiam sempre de mão dada com a rainha do Carnaval ao final da noite.

Mas as "chicotadas psicológicas" raramente produzem soluções a longo-prazo. Razão pela qual fiquei, ironicamente, esperançado com o jogo de ontem. Brilhantismo, nem vê-lo. Velocidade tão pouco. Inspiração, muito menos. Tirando o resultado, três dias de Amorim não parecem ter surtido o mais pequeno efeito no futebol do Sporting. Na prática, do estado comatoso em que a equipa saiu de Famalicão, ontem o renascimento manifestou-se meramente num estertor cadavérico na cama do hospital, posto o que o corpo enfermo do nosso futebol se virou custosamente para um dos lados, fez um xixizinho na algália, queixou-se da posição da almofada e depressa regressou ao estado vegetativo original, com um 2-0 na mala e já não foi mau.

Foi, por assim dizer, uma palmadinha psicológica. Para já. Pois para Amorim o verdadeiro trabalho começa agora, na ala de psiquiatria, mais concretamente, já que o primeiro grande obstáculo a vencer é o bloqueio mental que os jogadores sentem sempre que a bola vem ter com eles, acobardados com a cobrança das bancadas, mistificados com o vazio da vida, plenamente cientes de que, no ambiente actual, uma salva de assobios no momento errado pode custar-lhes o emprego. Razão pela qual o futebol do Sporting parece equivaler-se, neste momento, a uma espécie de carrossel para menores de 6 anos, animado por uma mecânica rudimentar, cautelosa e previsível, na qual os jogadores recebem a bola, pensam nas mil e uma maneiras como a morte os poderá levar, e optam, regra geral, por desfazer-se da mesma da forma mais segura possível — o que, convenhamos, é uma dinâmica responsável para um lar de 3ª idade, mas gera poucos benefícios numa actividade que costuma laurear quem corre mais e melhor.

Do banco, Amorim assistiu, atónito, ao esfrangalhar de um clube com mais de 100 anos de vida. A sua chegada não produziu qualquer fogo-de-artifício. Mas talvez seja melhor assim. O Sporting não precisa de picos de emoção e curativos na hora. Precisa é de alguém que meta as mãos à obra e comece por remover o entulho espalhado no chão. Com um contrato longo, Amorim terá mais tempo para esse trabalho. Que remédio... Talvez estejamos a assistir à inversão dos pressupostos da "chicotada psicológica". E isso seria muito bom.

05
Mar20

Casino de Alvalade

O Esférico

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Desde que um tal de José Mourinho deixou Vilarinho pregado à cadeira para vir a tornar-se um mito ao serviço do Porto, a busca pelo próximo profeta do futebol nacional tem sido a principal demanda pelo Santo Graal em terras de Marcelo I. Desde então, muitos ameaçaram vestir o sagrado manto. Villas-Boas, Domingos, Conceição — sem efeito. E até um certo sr. Azenha tinha "metodologias muito semelhantes" ao profeta sadino, até o Benfica lhe despachar a carreira com um 8-1 e um lacinho. Pelo caminho, fomos todos apanhados na curva por um certo mister de juba folclórica, cujo apelido de mártir Nazareno prometia frugal carreira, mas que veio a revelar-se praga tramada para os adversários: o superlativo Jorge Jesus.

Chegados a 2020, o Sporting também julga ter encontrado o seu Santo Graal. Talvez sentindo os augúrios da lenda em formação — e escaldada pelas fugas anteriores de Mourinho e Villas-Boas —, a SAD decidiu jogar na antecipação. Amorim, O Conquistador, já não será coroado em Benfica e Porto nos próximos tempos. Resta saber se, no Sporting, não passa de Conquistador a Marreta num ápice, engolido pelo anti-ciclone de Alvalade.

Amorim tem 2 meses de treinador no 1º escalão e custa 10M aos cofres do clube. É, portanto, mais uma aposta de risco elevado para Varandas, que tem por hábito falhar nestas jogadas de casino. A lógica mandaria que Silas aguentasse o barco até Maio. Afinal, já não perseguimos qualquer título, e mudar de técnico agora acarreta o risco de estarmos a entregar um cálice envenenado ao novo incumbente. Mas lógica não é propriamente o forte desta gestão. É pesar os pressupostos austeros da época contra este investimento inédito num técnico. E agora liquidou parte da almofada que tinha para o verão e dotou, por tabela, o Braga de um orçamento de leão.

Mas é preciso ressalvar a subjectividade de tudo. Há treinadores que fazem muito com pouco (Bento era um desses), e há treinadores que fazem pouco com muito (Lopetegui, por exemplo). O plantel do Sporting não é tão mau como os números indicam. Com um dedo atencioso, há margem para melhorar. Mas mesmo o técnico mais dotado não pode trazer o paraíso à Terra se não tiver as ferramentas certas — ou se for minado pela mesma estrutura débil que orquestrou o descalabro presente.

Há também um lado mais racional na questão. Arrisca-se porque há a muda admissão de que se bateu no fundo. Joga-se com a aura transcendental que Amorim angariou em pouco tempo para reanimar o sonho. Se, por acaso, nestes 2 meses, o futebol melhora, e os resultados também, isto poderá dar o impulso para a época seguinte que de outro modo não se conseguiria. Com a justiça prestes a desabar sobre o Benfica, e o Porto em processo de bancarrota, este momento pode ser fulcral para dar um golpe de asa e virar as nossas sortes.

Amorim teve um início arrebatador ao serviço do Braga. Tragou Sporting, Benfica e Porto num ápice, escorregou na Liga Europa, mas rapidamente consolidou o 3º lugar. Tanto quanto sei, Amorim pode ser a próxima grande invenção do futebol nacional. Ninguém pode, para já, garantir o contrário. E, se assim for, a exorbitância agora investida parecerá coisa pouca daqui a um ano. O futebol é fértil em impulsos, e convém ter algum recato antes de sabermos os resultados.

Tudo o resto me parece secundário. Nada me interessa a ligação passada de Amorim ao Benfica. Nada me interessam os pruridos éticos invocados (se as regras o permitem, o SCP tem que servir-se delas para agir no que julga ser do seu superior interesse). A mim apenas me interessa que Amorim justifique os lisonjeios que tem recebido — merecidamente — de todos os lados.

05
Mar20

Pára o Baile

O Esférico

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O recentemente falecido Vasco Pulido Valente deixou-nos estas palavras, escritas em 2006, as quais assentam que nem uma luva aos factos ontem ocorridos:

«Na história do Apito Dourado, por exemplo, o ponto mais típico e revelador, no fundo, o ponto mais português, não é o descaramento ou o cinismo, é o tom de intimidade, às vezes, de verdadeira estima da conversa. "Ó pá, ó fulano, ó amigo", repetem os vários vigaristas com um inconfundível calor de família. E, num certo sentido, são mesmo pessoas de família, que durante anos se ajudaram, se aldrabaram ou zangaram para maior glória do futebol. Torcer uma regra ou subornar um árbitro entra numa velha rotina, que já ninguém considera estranha ou condenável.
No caso do Apito Dourado, a "escuta" abalou a tradição. Um acidente sem grande importância. Em Lisboa inteira, e suponho que em Portugal inteiro, os donos da economia, do sector público e do sector privado jantam e almoçam em público, com inteiro sossego, para trocar "informação interna" ou traficar influência. [...] Como o patriótico pessoal do futebol, também eles se conhecem: da faculdade, de uma empresa, de um governo qualquer. Pior (ou melhor) ainda: a mulher do A é cunhada do C, o filho do B casou com a sobrinha do F, e por aí fora, sempre à volta. Uma palavrinha aqui, um favorzinho ali, não lhes parece nada de extraordinário. [...] Uma sociedade pequena e pobre (e, por cima, católica) gera necessariamente corrupção. O número, o anonimato e a distância reforçam o rigor; a estreiteza, a convivência e a proximidade criam o mundo paralelo dos "compadres".»

Se há acaso feliz que decorre das novidades de ontem, esse tem a ver com a transversalidade das suspeitas. Não há argumento exculpante para o típico adepto obtuso, que por defeito vê em qualquer investigação individualizada o focinho odioso de uma obscura conspiração contra o seu clube de eleição. A malta, na miséria partilhada, torna-se mais mansa, mais convidativa à justiça. "Está bem, se tu vais ao fundo, eu também não me importo de ir", lá confessam, a esforço. Porque também o futebol português habita neste microcosmos de pulhice contagiosa, em que os seus protagonistas se infectam mutuamente de esquemas transmitidos a passou-bens no terraço do Ritz, não surpreende que o mais pequeno pontapé numa pedra revele logo, sem esforço, uma ninhada de lacraus. Para uma investigação tecida durante 5 longos anos, é natural que vá tudo na rede.

Sem surpresa, os suspeitos do costume coleccionam mais um dia em tribunal. Pinto da Costa, Vieira, Salvador, Bruno de Carvalho, Carlos Pereira, etc. Está lá a corja (quase) toda. Têm o medalheiro cheio, não é difícil imaginá-los a partilharem com os netos, galhofeiros, a história de cada acusação. "Olha, esta ganhei por causa duns chocolatinhos que ofereci a fulano... escapei-me por pouco por uma viela processual", diz um. "Esta foi quando roubei um camião. Não fosse a amnistia do doutor...", afiança outro. Previsivelmente, estão todos satisfeitíssimos por "colaborar com a justiça". Do alto do pagode, declaram-se todos inocentíssimos. Não fosse a terrível maçada das trafulhices, colaborariam com a justiça até nas horas vagas, eu sei... É como a velha história do peido: cheira mal, mas ninguém se acusa.

O nomeado-surpresa da noite foi mesmo Varandas. Por casos que, alegadamente, dizem respeito ao mandato de BdC, por fado fatal ou vontade própria, a verdade é que embarca na sua primeira "travessia do arguido". Para ele também fica a lição: não há dama que arremeta dois virtuosos passos pelo pantanal lusitano sem imediatamente ficar com os saiotes salpicados de lama. Foi a sua estreia, e talvez não seja a última.

Quanto a mim, é motivo de regozijo sempre que a justiça sacode a poeira dos manuais. Há muito que esta pocilga precisa duma varridela geral.

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